terça-feira, 26 de outubro de 2010

Frustração ou Felicidade?

Depois de muito enrolar, finalmente propus para o Pedro que lêssemos juntos um livro. Precisava comprovar aquilo que venho pregando – que a leitura compartilhada é muito gostosa e proveitosa. Que essa experiência é válida para qualquer idade e que ler junto estreita os laços.

Ler para e com a Luísa é bem fácil porque ela, apesar de já ter suas preferências literárias, aceita bem nossas recomendações e sugestões. Para ela, a experiência de ler junto ainda está mais ligada ao fato de estar em companhia de um de nós (pais, irmão ou avós) do que ao fato de estarmos compartilhando uma obra literária. Acho que por isso o que ela mais gosta é de fazer essa leitura compartilhada à noite, antes de dormir. Ela é meio medrosa, não gosta nada do escuro, por isso acho que esse momento traz tranquilidade e uma dose extra de segurança para “enfrentar” o momento de adormecer sozinha. O caso é que ela está, certamente, mais interessada na proximidade física do que na apreciação literária em si.

Já o Pedro quer a maior distância física possível de nós! Quer dizer, não é bem assim. Tem dia que ele acorda inspirado e sai distribuindo abraços apertados a torto e a direito. Nesses dias a gente aproveita ao máximo! Mas beijo, por exemplo, ele prefere mesmo é das namoradas. E esse negócio de chamego com pai e mãe está totalmente fora de questão. Ai, que saudade...

Bom, mas fato é que o Pedro é um cara muito bacana e quando expliquei que queria escrever sobre ele no blog ele aceitou que eu lesse um livro para ele. Só para me ajudar. Só para me dar assunto. Interessado na minha leitura ele não estava muito... mas topou mesmo assim. E para fazer a minha parte eu deixei que ele escolhesse o livro que queria. Lá volta ele com nada mais nada menos que as 670 páginas das Incríveis Aventuras de Kavalier e Clay, de Michael Chabon. Achei lindo porque ele escolheu um livro que eu já tinha recomendado para ele várias vezes e porque ele sabe que é um livro que eu adoro. Achei lindo mesmo... mas até suspirei quando vi. É que esse é um livro com uma linguagem super sofisticada, sentenças bem compridas, vocabulário rebuscado, daqueles beeeem difíceis de ler mesmo. Além disso, o Michael Chabon é mestre em lançar provocações, em costurar o enredo de um jeito que de vez em quando deixa a gente totalmente sem fôlego. Como é que o Pedro iria entrar nessa proposta se eu estivesse lendo para ele? Como é que eu saberia quando parar, onde pausar, para ele poder digerir o que tivesse que ser digerido?  Para ele refletir sobre o que tivesse vontade/necessidade?

Eu nunca tinha pensado em nada disso antes. Nunca tinha pensado que tem livro que simplesmente... não dá para ser lido em voz alta! Aliás, se alguém tivesse me dito isso antes daquela noite eu teria negado convictamente. Sempre tive prá mim que qualquer leitura poderia ser desfrutada a dois. E foi por isso que, apesar de meus temores, me pus a ler para o Pedro.

Já disse que meu filho é um cara muito bacana? Pois então. Ele ouviu minha leitura atentamente – até desligou a tela do computador! – durante três dias seguidos. Eu fiquei na maior ilusão, achei que íamos nos sentar juntinhos na cama dele, mas ele ficou na cadeira mesmo. Apesar disso, me ouviu com o maior cuidado e à cada capítulo me confirmava que estava gostando da história e que queria continuar.

Quem pulou do barco fui eu. Simplesmente fui deixando para depois, para mais tarde, para amanhã e assim os dias foram passando e agora já faz três semanas que não pegamos no livro.

Por que? Simplesmente porque percebi que não estávamos curtindo. Enquanto lia, o Pedro me escutava com a maior atenção, mas não sei se ele estava fazendo aquilo por ele ou por mim. E leitura assim não vale. Mesmo quando é compartilhada tem que ser curtida pelas duas (três, quatro, dez) partes – por todos envolvidos no processo! Por isso abortei o projeto.

Foi bastante frustrante reconhecer que minha investida não deu certo. Eu queria TANTO redescobrir o prazer de ler com o meu filho! Mas (ainda bem que o mas existe...) talvez eu tenha que reconhecer também que esse momento passou. Que temos personalidades leitoras diferentes. Que já somos leitores totalmente independentes?... Não sei. Preciso elaborar melhor isso.

O bom da história é pensar que o Pedro não precisa mais de mim para ler. Apesar da nossa tentativa não ter dado certo, ele lê muito e sempre. De presente, noutro dia, me pediu uma “assinatura” num site de áudio-livros. Recebe um crédito por mês e baixa os livros no computador. Daí pode gravar em cd, passar para o mp3, mp4, sei lá mais o quê. Então – quantos meninos de 15 anos PEDEM livros de presente hoje em dia?

Acho que o importante é isso aí mesmo. Reconhecer a felicidade, mesmo na frustração. Meu filho é um leitor e tanto e tenho certeza que eu contribuí muito para a sua formação leitora. E quem sabe? Talvez com um outro livro possamos retomar o projeto...