segunda-feira, 18 de abril de 2011

Alice de Muitos Jeitos

Não me lembro de ler Alice no País das Maravilhas, do Lewis Carroll, quando criança.  Acho, no entanto, que muitos da minha geração lembram-se de assistir às versões dos clássicos produzidas pela Disney para o cinema.  (Sou filha de Brasília e adorava as sessões de sábado do Karim Criança, lá no Conjunto Nacional, onde assistia aos filmes, brincava nos túneis de pano e nas almofadas enquanto comia um Kri).  Na verdade não sei bem quando foi que li Alice...  mas sei que com a nova versão para o cinema, desta vez em filme do Tim Burton, o meu movimento foi o oposto.  Não assisti ao filme, mas acabei me deparando com duas lindas e intrigantes versões do livro: uma grandona, colorida, de capa dura, ilustrada por Michael Foreman e a outra pequeninha, com ilustrações em preto e branco, que apareceu grátis num aplicativo de livros digitais que baixei para o meu ipod.

Há algumas semanas consegui cavar uma brecha no momento-de-leitura-antes-de-dormir.  O Felipe estava trabalhando muito então entrei de substituta e perguntei se a Lulu queria ler o Alice no País das Maravilhas.  Como estava empolgadíssima com a novidade de ler livros no ipod, propus que ela acompanhasse no livrão enquanto eu ia lendo prá ela do ipod.  Ela não gostou nem um pouquinho.  Torceu o nariz, disse que não.  Eu insisti, disse que estaríamos as duas na cama, juntinhas e ela acabou aceitando.  Lemos um capítulo, lemos dois e no terceiro dia ela me deu um ultimatum: "Hoje é sem ipod!  Vamos ler só do livro mesmo."

É realmente incrível que eu, estudando o tema de leitura em voz alta e leitura compartilhada do jeito que tenho feito, possa ter proposto uma bobagem dessas.  Queria mostrar para a Luísa que não importava o meio de leitura (livro digital/livro impresso) porque afinal de contas o texto era o mesmo, a história era a mesma.  Mas nessas de querer inovar, acabei me esquecendo do principal: do aconchego que existe quando se compartilha o livro.  É tão simples e tão óbvio: UM objeto que une duas pessoas, a história que toma vida a partir da leitura feita em voz alta e compartilhada num momento de comunhão. 

Não penso que o problema tenha sido o livro digital.  Acho que o problema foi justamente eu querer inserir um quarto elemento na nossa experiência.  Vivo falando na feliz triangulação de livro, leitor e ouvinte nos momentos de leitura compartilhada, mas vejam só!  Me atrapalhei na minha própria convicção.

Pelo menos a postagem tem final feliz.  Larguei o ipod, me encostei na Lulu e terminamos de ler juntas as aventuras de Alice.  Felicidade pura.

sexta-feira, 18 de março de 2011

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

CILELIJ - Santiago do Chile - 2010

Ontem fez um ano que um terremoto de força 8.8 na escala Richter se abateu sobre o Chile.  Eu estava lá, mas não consigo colocar em palavras tudo o que vivi e senti.  No ano passado, uma amiga mexicana propôs que eu escrevesse uma crônica sobre o Congresso de Literatura Infantil e Juvenil que me levou ao Chile.  Escrevi, guardei e nunca mais olhei para ela.  Até ontem.  Hoje eu gostaria de compartilhar minha experiência aqui.

Nosotros, los de entonces, ya no somos los mismos ~ Pablo Neruda

Mal conseguia conter meu entusiasmo quando subi o primeiro degrau da entrada do Museu Nacional de Belas Artes de Santiago do Chile. Ali, naquela noite de 24 de fevereiro, se realizaria o coquetel de inauguração do Primeiro Congresso Iberoamericano de Lingua e Literatura Infanto-Juvenil - CILELIJ. Pelo hall de entrada do Museu podia-se ouvir o burburinho das conversas animadas. Um traço de expectativa pelo que ainda ia acontecer marcava todas essas conversas. O ar estava cheio de animação e entusiasmo. E sorrisos estampados nos rostos das pessoas espalhadas pelo salão – sorrisos de boas vindas das recepcionistas à porta que nos convidavam a entrar, sorrisos de colegas que se encontravam para um evento fora do local de trabalho, sorrisos de pessoas que acabavam de se conhecer.

Me sentia absolutamente extasiada com a possibilidade de ver de perto autores e estudiosos que eu só conhecia dos livros. Era um sentimento meio “tiete”, mas ali estariam “ao vivo” pessoas que me divertiram, ensinaram, comoveram e acompanharam por toda a infância, juventude e, como não?, também na idade adulta. Nomes como Ângela Lago, Lygia Bojunga Nunes e Ana Maria Machado saltaram das capas dos livros e viraram pessoas como eu, de carne e osso. E ali me contavam novas histórias - histórias de cidadania, histórias da importância da leitura na vida das pessoas e sobretudo histórias de paixão pela literatura.

A cada sessão me surpreendia com nova enxurrada de informação e ideias. Ao mesmo tempo que aprendia, me dava conta de que tudo o que eu ouvia vinha simplesmente confirmar minhas convicções e minha visão de professora, de como a literatura infantil deve ser usada em sala de aula... e mais além. A leitura tem poder transformador e ainda que os livros permaneçam em seus lugares, nas estantes e prateleiras de bibliotecas e salas, as histórias que trazem consigo ultrapassam barreiras de paredes e muros. As histórias se tornam parte de cada um que entra em contato com elas – basta haver um encontro.

Foram vários os encontros que tive com pessoas de talento enorme que escolheram como carreira o comprometimento de levar a literatura a todos os cantinhos dessa nossa América tão Latina. São milhares as iniciativas de promover a leitura por nossos países, iniciativas públicas ou privadas, que são levadas adiante por braços fortes e corações valentes. Ouvir falar sobre Lectura Viva e Fundalectura na Colombia, sobre o Plano Nacional do Livro e da Leitura no Brasil e sobre as ações do Consejo Puebla de Lectura no México me fez perceber que temos muito o que aprender uns com os outros. Temos caras idênticas, apesar de sermos intrinsicamente diferentes. Boas ideias abundam. Me pergunto se não é possível fazê-las chegar a outros lugares além de seus berços de origem.

A programação do congresso era intensa e não havia espaço para folgas. Assim que, entre ponencias e falas, entre conversas na fila do banheiro ou tomando um café, fui sendo apresentada à literatura infanto-juvenil iberoamericana. Minha ignorância (no sentido mais literal da palavra: falta de saber, ausência de conhecimento) foi diminuindo pouco à pouco, sessão à sessão. Ao cabo de dois dias já me perguntava como era possível que nunca tivesse lido Papelucho de Marcela Paz. Panoramas e correntes se descortinaram perante meus olhos. O cenário do mundo da LIJ se transformava em conhecimento até que na madrugada do meu quarto dia em Santiago a surpresa da natureza foi maior que tudo o que já tinha ouvido até então.

Acordei com um rugido alto e insistente, um barulho de trovão de origem equivocada. Como podia ser que aquele estrondo viesse do chão? Quando a palavra terremoto se formou em minha cabeça, saltei da cama para fora do apartamento. Quando dei por mim já estava de pé no meio da rua, descalço e de pijama. Só. Tudo se movia, a rua, a calçada, os prédios à minha frente, os prédios às minhas costas. Eu sozinha, no meio da rua, observando como o mundo todo parecia feito de borracha, gelatina molenga que treme quando a gente apoia a tigela nalgum lugar. Não sabia se era alucinação, se estava ficando louca. Só o barulho me acompanhava, a trovoada incessante, os alarmes disparados dos carros e um cabo de eletricidade que estourou no fim da rua.

Às 10:00 da manhã, me achando refeita do susto, fui em companhia de minhas colegas de congresso procurar saber o que estava acontecendo com os outros participantes. Estava certa de me deparar com um cartaz de ‘cancelado’ na porta do museu onde se realizavam as palestras. Me deparei foi com as escadarias do museu cobertas de entulho, o edifício isolado por uma fita preta e amarela. Lembrei-me da foto que o grupo tinha tirado na véspera, naquelas mesmas escadarias. Minha total inexperiência telúrica me deixou totalmente sem chão. Não conseguia alcançar a totalidade do que estava acontecendo.

Não havia placa de cancelado diante do museu. Havia sim membros da organização que estavam ali desde cedo, para recepcionar àqueles que não estavam hospedados nos hoteis onde estava a maioria dos participantes. Nos receberam com vozes calmas e olhares suaves. “Sim, sim, foi triste, sim, sim, muito assustador, não, não, nada de grave conosco, felizmente estamos bem. Mas olhem bem, estamos reunindo a todos no hotel São Francisco. Ali receberão mais informações. Aqui está a van que vai levá-los até lá.” Seguimos atordoados até o hotel, onde um grupo grande já se sentava para ouvir o que os organizadores tinham a dizer.

Foi lamentando perdas, muitas perdas, que se interrompeu o CILELIJ. Tentamos seguir trocando ideias, ouvindo falas apressadas e leituras engasgadas daqueles que deveriam se apresentar naquele sábado. Queríamos estar juntos, mas tinhamos o coração embotado e as lágrimas insistiam em escapulir. O congresso foi encerrado assim, com muito pesar.

Muitos de nós ainda ficaram vários dias no Chile, esperando que se reestabelecesse o funcionamento do aeroporto. Só muitos dias depois de voltar para casa é que fui olhar o programa incompleto do congresso. Me dei conta de que depois de três dias em que se pintaram todas as telas do passado e do presente da LIJ, ficou nos faltando falar sobre o futuro. Justo o futuro que nos promete tantas mudanças e inovações. Mas acho que estamos no caminho certo enquanto continuarmos fazendo esforços para ouvir-nos uns aos outros, conhecer-nos e assim seguir incrementando as iniciativas de fomento à leitura. Nisso o CILELIJ primou. Espero ansiosamente pela próxima edição.

Essa crônica terminou no parágrafo aí de cima, com o encerramento abrupto do CILELIJ. Este parágrafo aqui serve apenas para aproveitar o restinho da página com um assunto absolutamente pessoal. O CILELIJ significou muito mais que uma experiência profissional. É certo que a tragédia que sentimos, vivemos e assistimos ficou para sempre gravada na memória. Mas dizem por aí que é nos momentos de maior tensão que o ser humano se despoja de todas as máscaras e mostra realmente ao que veio. O que ficará para sempre guardado comigo é o valor e a coragem dos Chilenos, que apesar de estarem lidando com tamanha tragédia, ainda encontravam dentro de si palavras de consolo e tranquilização para nós, estrangeiros. Fomos ainda mais acolhidos e bem-cuidados depois do terremoto. Não há como esquecer, jamais, o profissionalismo de todos os envolvidos com a organização do congresso, a presença segura e constante de Sérgio T. (que certamente descobriu o segredo da clonagem perfeita porque estava sempre em todas as partes) e a amabilidade infinita de todas as “mãos invisíveis”. Dizer obrigada não é o bastante.

Vi também que em momentos de crise os laços se estreitam mais rápido e mais forte. Depois de encerrado o congresso, tive a oportunidade de aprofundar o contato com pessoas que conheci durante os eventos e de conhecer outras pessoas, que provavelmente não teria conhecido se a situação fosse distinta. De meus queridos novos amigos de Guatemala, Peru, Paraguai, Chile e dos muito mais que queridos amigos Mexicanos, fica a recordação de momentos muito especiais e a esperança de uma amizade para sempre.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Uma leitura puxa a outra

Não houve leitura em familia nas férias.  É isso aí.  Tanta preparação e nada.  Nadica mesmo.  Aliás, não.  Seria melhor dizer que não houve leitura em voz alta nas férias.  Não li para a Luísa nem uma linha do livro que escolhemos para colocar na mala.  Para o Pedro então...  O máximo que li para ele nos últimos tempos foi alguma notícia de jornal, mas de literatura mesmo - necas.

Isso não quer dizer que a literatura não nos encontrou nesse verão.  Ficou cada um na sua... mas pelo menos a leitura aconteceu.  O Pedro descobriu os livros do Robert Jordan e resolveu mergulhar de cabeça na série d'A Roda do Tempo.  Ele chegou a me dizer que esses livros são melhores que os do Tolkien (!!!) mas resolvi dar um desconto porque ele tem só quinze anos.  Também comprei para ele a trilogia do Livro do Tempo, do francês Guillaume Prevost.  E de Natal ele ganhou vários da série Duna, do Frank Herbert.  O Jeff e a Adri deram o primeiro da série para ele em julho e acertaram em cheio.  Ele amou e quis mais.  (Dá para perceber que o Pedro adora fantasia/ficção científica, não é?) 

Agora mesmo, enquanto escrevo, ele está deitado no sofá, lendo.  Acho que os livros que vem em série tem grande apelo para os jovens da idade do Pedro.  Talvez seja porque eles proporcionam ao leitor o reencontro com personagens queridas, reestabelecem relações construídas anteriormente... mas isso é papo para outra postagem.

A Luísa, por sua vez, andou conhecendo autores novos.  Adorou o livro Era Mais Uma Vez Outra Vez, da Gláucia Lewicki com ilustrações do Cárcamo.  E eu também adorei!  História divertida e gostosa, faz o leitor se perguntar o tempo todo onde é que a coisa vai dar.  Depois a Lulu leu A Casa Pintada, da autora espanhola Montserrat del Amo.  Agora ela está mergulhada no Agito de Pilar no Egito, da Flávia Lins e Silva, que eu peguei para ela na biblioteca.

Essa menina gosta muito de tudo o que tem a ver com o Egito Antigo.  Já leu sobre múmias faraós e hieróglifos - se interessa de verdade pelo assunto.  No ano passado ela já tinha lido outro livro da Pilar - As Peripécias de Pilar na Grécia.  Quando viu o livro da Pilar no Egito quase alucinou.

Bom e foi preciso tudo isso para explicar minha ideia de que uma leitura puxa a outra.  Já aconteceu comigo mil vezes e vai continuar acontecendo com todos que gostam de ler.  Leitores muitas vezes escolhem suas próximas leituras por causa de um tema que lhes interessa, de um autor que lhes agrada.  E quando estão bem seguros em relação às suas preferências, topam arriscar mais ou menos qualquer novidade que lhes chame a atenção.

Fiquei um pouco frustrada por não ter tido nenhum momento de leitura compartilhado com meus filhos.  Achei que durante as férias pudéssemos recuperar aquela cumplicidade de ler juntos que fomos perdendo ao longo do ano letivo.  Mas agora estou mais conformada porque percebo que, na verdade, meus filhos já são leitores independentes, com o hábito da leitura formado e solidificado.  Talvez meu papel esteja mudando mesmo.  Talvez minha "tarefa", a partir de agora, seja só a de conversar bastante sobre o que eles estão lendo e proporcionar o máximo de "material de leitura" (interessante, variado e de qualidade) possível.  Talvez.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Viajar com livros

Na mala veio de tudo; do maiô ao jogo de Uno, não faltou nada.  Não vamos ficar tanto tempo fora portanto a tarefa de separar o que deveria ser colocado na mala até que foi fácil.  O mais bacana de tudo foi quando a Luísa disse, "E não vamos nos esquecer dos livros!"  Separei o Como Falar Dragonês da Cressida Cowell porque estamos curtindo muito essa série engraçadíssima.  Só que não foi o bastante.  Dali a pouco olhei para a pilha de coisas em cima da cama e vi outro livro.

-Lulu, não precisa de outro livro.  Vamos ficar só quinze dias fora.  Um só já vai durar a viagem inteira.
-Mãe, o Como Falar Dragonês é para nós lermos juntas.  O Frindle é para eu ler sozinha, oras.

Como é que eu não pensei nisso?  Tem hora para tudo.  Para ler junto e para ler sozinho.  É óbvio. 

Fiquei inchada de orgulho.  Já faz tempo que o Pedro carrega 5kg a mais de bagagem por causa dos livros cada vez que sai de viagem, mas ainda não tinha visto isso acontecer com a Luísa.  Adorei ver os dois filhotes se preparando para viajar por aí - voando solo para terem suas próprias aventuras.